Sempre que estou atendendo uma família, é comum elas me perguntarem: – Doutora o que nós, como pais, podemos fazer para termos um ambiente legal / de paz em casa?
Parece fácil responder, principalmente quando temos na manga da camisa uma receita de bolo. Infelizmente não acontece assim na prática. Todo relacionamento familiar tem suas particularidades e ele só tende a melhorar quando os pais são verdadeiros artistas em adaptar seus próprios valores, ou seja, os valores pessoais e aqueles que foram adquiridos em seus lares de passagem.
Em lar de passagem eu estou me referindo, a casa que vivíamos quando crianças. É claro que naquela época agente precisava ser de um “jeitão”. Esse jeitão nos deixava forte para seguir em frente com a nossa vida. Entretanto, aquele jeitão de antes pode ser que esteja em desuso nos dias de hoje. Pode ser que a maneira como víamos o mundo naquela fase não sirva mais para ser utilizado com nossos filhos.
Querem um exemplo? Quando eu era adolescente, em São Paulo, meus pais me obrigavam, e, é verdade, a chegar em casa, aos sábados, antes das 10 h. Olhe, que eu já tinha mais de dezessete anos. Se hoje, nós quisermos realmente estar próximos de nossos filhos, nós teremos de nos flexibilizar. Flexibilizar o horário, buscá-los nas baladas, de pijamas, ainda enaltecer o Luan Santana, afirmar que realmente ele canta bem e é um gato. Não é uma questão de falsidade e sim de nos achegarmos aos nossos filhos por meios que eles valorizam.
E ai vale a música, as redes sociais, a internet, o esporte e outras coisas que sejam valorizadas por eles. Não têm a linguagem dos sinais, utilizadas com os deficientes auditivos? Pois bem, pais também usam uma linguagem especial com os filhos e essa linguagem é adaptada a cada faixa etária, ou seja, bebê, criança e adolescente. Outra coisa que é muito enfatizado pelos pais nas sessões é o desejo de que os filhos se dêm bem na vida.
Claro que compreendo e também como mãe espero isso para meus filhos também. Por outro lado, não podemos esquecer que nossos filhos terão uma chance maior em se dar bem na vida se eles tiverem um modelo de referência em casa. Não estou falando de um modelo fantasioso e distante tipo Einstein, Lula, Xuxa, Ronaldinho e outros. Estou enfatizando que é em casa que aprendemos a ser amados e valorizados e, por conseguinte a desenvolvermos uma boa autoestima e a valorização das pessoas que nos cercam.
É o famoso amar e ser amado em casa e depois ir ampliando para os parentes, para os amigos, para os professores e para a comunidade. Quando os pais expressam de maneira clara o que não desejam de seus filhos e mostram com exemplos próprios o que querem deles é muito mais fácil ter uma família legal. Todos sabem o que esperar um do outro – o jogo é as claras. O que dificulta a convivência ou os padrões de relacionamento em uma família são as mensagens duplas. Por mensagens duplas podemos entender aquela do tipo penso uma coisa e faço outra.
É simples de entender. É como se eu pedisse um abraço ao meu filho e eu colocasse meus braços para trás. Meu filho tenderá a ficar confuso e negará meu abraço. Em seguida eu digo: – Tá vendo, você não me ama! É louco não? Contudo, acredite, muitas vezes fazemos isso com nossos filhos e nem percebemos. As mensagens duplas proporcionam confusão na família, e, atitudes comportamentais que vão do ir mal na escola até atos de delinquência.
A família legal é construída no dia a dia em meio a atitudes positivas, responsáveis e amorosas e aqui me refiro a colocação de limites. Quando demonstramos aos nossos filhos que estamos seguros do que estamos fazendo e ao mesmo tempo valorizamos com parcimônia suas reivindicações, estamos promovendo em casa um verdadeiro laboratório de aprendizagem e ao mesmo tempo estamos dando a oportunidade dos filhos pensarem junto dos pais o que é certo e o que é errado.
Filhos pensantes são indivíduos com potencial para serem competentes em várias áreas da vida quer profissional, quer amorosa, e, quer social. São pessoas que vão crescer com valores positivos na vida e certamente amanhã não vão colocar fogo em índio e nem matar por amor – se é que por amor é possível tirar a vida de alguém.
Um outro dado interessante que costumo ouvir de pais é que eles gostariam muito que seus filhos fossem como eles, fortes, decididos, batalhadores, engenheiros, médicos, professores e por ai a fora. Quando escuto isso costumo perguntar: vocês querem filhos xerox ou querem filhos incubadora?
Devo dizer que os pais se assustam com minha indagação e logo os tranquilizo com a reparação: filhos Xerox são aqueles que reproduzem os acertos e os erros dos pais sem nenhuma pitada de criatividade – são pessoas criadas para agradar ao outro e não a si próprio. Já os filhos incubadora, são verdadeiros campos de criatividade a serviço do desenvolvimento pessoal e da comunidade. Quando os pais estão abertos para os filhos é muito mais fácil construir uma família legal.