A falta de estabelecimento de vínculos sólidos não é uma exceção na atualidade. É um mecanismo de defesa para não sofrer. Não sofrer o que ou do que?
Não sofrer a revivência do desamparo, da falta de atenção, dos abandonos ao longo da vida, e, outras situações aflitivas não menos doloridas. A indiferença é uma proteção do tipo, se eu não amo, ou, me conecto com alguém, eu não tenho chance, ou, corro risco de perdê-la. Assim, a construção de vínculos é sempre superficial. Não perco o que não tenho!
Nessa toada, muitas pessoas passam pela vida, sem realmente desfrutar dela. Seus feitos e suas conquistas são desprovidos de entusiasmo e envolvimento afetivo – a vida tem uma configuração superficial e as pessoas que convivem com pessoas indiferentes se sentem vorazes por amor e afeto.
O indiferente estimula no outro uma confusão psíquica, pois, falam de amor e paixão, mas são indiferentes a eles – não sabem como expressá-los.
Onde tudo começou? A indiferença é genética? Passa de pai para filho? É contagiosa?
Creio que a origem deste mal tem seu início na infância. O indiferente lutou muito para receber afeto e suprimento amoroso de sua família. O fez com muito ardor. Como não conseguiu, perdeu a esperança e se fechou – deu as costas para hostilidade e prometeu a si mesmo negar as emoções. O lugar das pessoas é bem distante de mim.
Como tem dificuldade em se relacionar com o outro, o indiferente se apaixona pelo seu trabalho, por esportes, por projetos diversos e outros. Sua constante atividade o mantém distante de seus sentimentos e de suas necessidades.
Tudo iria muito bem se o indiferente ficasse indiferente ao matrimônio e a constituição de uma família. O problema é que muitos indiferentes se casam e têm filhos. Como não desenvolveram a habilidade em lidar com os afetos, descuidam das questões emocionais da família – sua energia é toda gasta fora do ambiente familiar. O indiferente não consegue enxergar as necessidades afetivas da companheira e dos filhos. A final das contas como uma pessoa, que não identifica suas próprias necessidades, pode vislumbrar as necessidades do outro?
Outro dado que nos chama a atenção é que o indiferente, usualmente, agride as pessoas que estão mais próximas. O medo de se envolver com elas é tão intenso que os afasta.
Tive um casal, em atendimento terapêutico, que tratavam muito bem as pessoas de fora, mas quando o assunto era entre eles… Bem, não preciso revelar o quanto se agrediam e se desrespeitavam mutuamente. Isto quando a indiferença não durava semanas, para não dizer mais de mês.
E os filhos, o que dizer do relacionamento pais e filhos. Tratam os sobrinhos, os filhos de amigos com todo respeito e reverencia. Com os filhos em casa só há espaço para críticas e cobranças. Não há espaço para o amor sincero, carinho e incentivo das potencialidades individuais. Dessa maneira o ciclo ou o feedback se perpetuam: pais indiferentes geram e mantêm filhos indiferentes.
Por que os indiferentes continuam indiferentes se no fundo eles sofrem tanto?
Parece que se eles abandonarem essa auto-proteção (é como se fosse uma segunda pele) os indiferentes correm o risco de se tornarem vulneráveis e se desintegrarem num vazio sem fim – elas sofrem e causam sofrimento, entretanto, preferem manter um bom espaço de distanciamento. É uma maneira de “viver” com segurança em um mundo, para eles, tão inseguro.